terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Carta

Sinto a tua falta.

Estarás sempre presente. Há tantos lugares que ainda estão cheios de ti (e ainda nem fui a Estarreja). Nas mesas vazias do Aracuá, ao volante do Hudson, a secretária no escritório, o toque das paredes das pedrinhas lá de casa, o rádio, a cadeira de pano em Santa Cruz.

Lembro os momentos repetidos que tivémos: o relato das viagens à América, as conversas sobre a bola, o ritual do jornal, as outras conversas, os passeios, o único jogo do Sporting que fui, o ritual do café, os estalinhos de papel, as castanhas assadas, o Quebra-Gelos, as brincadeiras, e claro: os donuts :P

Serás sempre o meu herói, sem medo do trabalho, honesto, generoso, bondoso e amigo. Nunca te disse mas sei que o sabes: admiro-te e inspiras-me a ser melhor.


Fui finalmente visitar-te. 2 anos e meio depois.

Consegui por fim compreender que não é simples a forma como sentimos e como vivemos os sentimentos e as memórias.

Os mecanismos neuronais são feitos de transferências de ideias e de memórias que disparam outras memórias. A tua partida ficou ligada a outras memórias, fortaleceu-as, penso que me escudei noutras desventuras para não enfrentar a tua ausência. Mas os filamentos e os processos do cérebro nada sabem do que é saudade e do que é sentir.

Os meus arrependimentos hoje são apenas de não ter aceite que o final se aproximava e não ter sido capaz de estar contigo na tua doença. Não ter sido o amigo presente para te dar um e outro abraço quando mais precisaste.

Pensar que senti algo a menos por ti, foi uma sinuosa e desnecessária tortura. Hoje compreendi o disparate que foi alguma vez duvidar dos meus sentimentos.

Choveu quando sai do cemitério. Foi pouco mas o suficiente para parecer hollywoodesco. A caminho de casa encontrei a avó, o pai e o Porto a quem dei um grande abraço. Não lhes disse ao que andava para não ficar tudo em prantos. Quatro pessoas, três gerações, memórias e sentimentos distintos, todos carregados de saudade, gratidão, admiração, respeito e amor.

Sorrio.
Não sei se é a isto que chamam nostalgia, mas já dizias que antes sorrir do que chorar...


Love,

Diogo